domingo, 11 de março de 2018

O "acaso" programado por Deus.

A rua estava movimentada, carros indo e vindo. As pessoas andando apressadamente, olhando pra seus smartphones ou com o olhar ligeiro sobre tudo, não enxergando nada.
Era um dia típico na famosa cidade que tem o mundo inteiro dentro dela. 
Olhando ao redor não dá pra saber de que país estamos falando.
Helena parecia andar no sentido contrário. Ela também tinha hora pra chegar, mas gostava de aproveitar o percurso. Detestava sair com pressa, por isso saía bem antes do horário pra chegar com calma.
Ela já conhecia o "guardinha"de trânsito que ficava na faixa de pedestres, um senhor de cabelos brancos todo sorridente! Todo dia eles se cumprimentavam. 
-Tenha um bom dia, senhorita.
-Muito obrigada! Bom dia ao senhor também.
Ela era uma das poucas pessoas que olhava nos olhos dele e respondia. Às vezes até puxava assunto enquanto o semáforo não abria.
Num desses dias, ela estava falando com aquele senhor e, distraída, esbarrou no homem que atravessava a rua.
-Ops, desculpe._ disse olhando e com um leve sorriso sem graça pelo "acidente" que causara. O café dele tinha derramado um pouco com o esbarrão.
-Ok. Sem problemas. 
-Ah, seu café...
-Tudo bem, eu compro outro._disse apontando para a cafeteira logo na esquina.
-Bom, eu estou indo lá. Se quiser compro e trago aqui pra você.
-Tá tudo bem mesmo, moça.

Chegaram na cafeteira. Apesar de não estarem juntos, chegaram juntos, claro.
-Bom, eu não costumo fazer isso, mas te pago um café. _ele disse. 
[Seu nome é Christian.]
Helena era comunicativa, mas gostava e observava mais ainda a comunicação não verbal.
Ele disse que não costumava fazer isso (pagar o café), mas puxou a cadeira para ela naturalmente na hora que foram sentar-se.
"Interessante, ele é gentil e isso é uma virtude. Mas por que frisa não ser?"_ ela pensava o ouvindo falar.
O "café" foi rápido. Ambos tinham compromisso. 

Dias depois ela recebeu uma mensagem na rede social. Era ele. 
"Eu vi na previsão do tempo que esse final de semana fará Sol na cidade vizinha. Sei que você é recém chegada por aqui, e adora praia,...Bem, talvez gostaria de conhecer alguns lugares."

Helena não tinha muita pretensão com ele, mas o achava agradável e parecia muito seguro. Ela admirava isso.
"Pode ser uma boa opção."_ela respondeu por mensagem.
"Ok. Te busco às 7h da noite"._Christian concluiu a conversa.

Ele era intrigantemente cativante. Parecia certeiro no que dizia e fazia.
Pontualmente ele chegou. Recebeu-a do lado de fora do carro, abriu a porta para ela e seguiram o passeio.
-Você disse que eu gostava de praia, mas eu nunca te disse isso.
-Bom, você tem um tom de pele bronzeado e eu vi nas redes sociais as coisas que você posta.
-Ah, você viu? Mas você não interage...
Ele a olhou e mudou o assunto.
-O que você quer comer?
Ela retribuiu o olhar e sorriu. Ele era discreto e ela gostava disso.

O final de semana foi ótimo. Surpreendente e estranho. Estranho porque ela havia passado alguns dias  na companhia de alguém que ela mal conhecia.
O tempo foi passando, as conversas aumentando. Mas quanto mais eles conversavam, mais ele parecia se afastar. 
Ele estranhava a boa conversa entre eles, os questionamentos dela. Estava tão acostumado a ser dominador (por natureza) que a interação dela o deixava inquieto.
Christian gostava mas algo o bloqueava.
Então, do nada, ele sumiu.
Helena continuou a vida, mas ela tinha sido tocada por ele.
Ele conseguia algo raro dela. Ele a "governava". 
Entenda. Ela se permitia, se submetia a ele facilmente. Reconhecia nele uma autoridade sobre ela.
Não, não estou falando de autoritarismo ou coisas ruins. Estou falando de algo sobrenatural mesmo.
Helena nunca foi rebelde, não tinha problemas pra entrar em acordo com relacionamentos, mas ele tinha algo a mais. 
Ela era sensata e inteligente, então, naturalmente ela direcionava as pessoas. De repente, ele a direcionava e ela sentia-se super confortável com isso.

Assim como sumiu de repente, voltou. Ligou pra ela : 
- Te busco para tomarmos um café às 5h da tarde, ok?
- Desculpe, Christian, não posso esse horário.
- Tudo bem. Que horas então?
O papo com ele era reto na maioria das vezes.

Ele levou-a no mesmo café onde se conheceram.
- Então, você queria conversar...estou aqui._Helena já foi diretamente ao assunto.
- Eu gosto de falar com você.
- Mas você se afasta, eu não sei lidar com isso, com essa inconstância que parece inconsistência.
- Não, não é questão de inconsistência.
- Eu sei.[...] Estou tentando entendê-lo, ajudá-lo como posso. Mas eu preciso que você se abra, fale.
- Eu te falo! Conto as coisas ...
- Você me conta as histórias. Quero saber das variações de suas emoções quando essas histórias acontecem. Quero saber do lado de dentro. Quero sua vulnerabilidade...
- Sua certeza e constância comigo me assustam...
- Você acha que não sinto medo de vez em quando também?!
- Eu sei que tem, porque você também não se entrega.
- Christian, entregar a quem? Como? Entregar a alguém que não vai ficar? E me diz, que relação é essa que temos? Não temos nada, nada que eu possa afirmar, tudo é muito confuso e subjetivo.
- Nós somos amigos, ué...
- Amigos?! Amigos tem liberdade de ligar um para o outro, e nós não temos. Eu, pelo menos, não. Amigos não dividem a cama por dias... Amigos não dormem abraçados. Amigos não ficam abraçados vendo o pôr-do-Sol. Desculpe, mas eu não tenho essa intimidade com meus amigos... Talvez você tenha, mas isso pra mim não é normal. Eu não consigo entender isso, não consigo dar nome para o que temos. [...]Você sabe do que sinto, do que Deus me falou... Eu lamento muito que seja assim, que você tenha se negado a tentar ao menos...
- Se eu tentar com você, sei que vai dar certo.
- Mas não é isso que você quer? Não é isso que todos querem "dar certo"?
- Claro que é o que quero... Sei que temos química, conversamos por horas e...
- E? Isso te perturba por quê? 
- Ok. Vamos tentar.
-Christian, você me chamou pra tomar um café, conversarmos. Olha que estranho, estamos conversando sobre nós, e pra você "nós" nunca existiu. Você consegue entender essa confusão aí dentro e o que essa confusão sua me causa? 
-Helena, eu sempre soube. A confusão é só porque esse "saber" é estranho pra mim. Não era pra ser só um "acaso" eu te conhecer?
-Nunca foi acaso, Christian. Foi desenhado por Deus e avisado com antecedência, mas eu sei que pra você isso não existe. Com licença...

Helena pediu a conta, deixou um dinheiro na mesa e se levantou.
Christian, ficou olhando-a ir embora mais uma vez... Ela virou pra trás, olhando dentro dos olhos dele e abaixou a cabeça.
Antes que ela atravessasse a rua, ele correu e puxou-a pela mão, trazendo-a pra bem perto.




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